As abelhas nativas são os principais polinizadores do açaí (Euterpe oleracea). É o que afirma um estudo que acaba de ser publicado na revista científica Neotropical Entomology pela Embrapa em parceria com a Universidade Federal do Pará (UFPA) e Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA). O trabalho mostra que elas representam mais de 90% do trabalho de polinização nas flores da palmeira e são mais eficientes no transporte do pólen que os outros insetos, o que impacta diretamente na cadeia produtiva do açaí.
O estudo foi realizado em oito áreas nos municípios paraenses de Barcarena e Abaetetuba. Foram analisadas quatro áreas manejadas de açaí de várzea e outras quatro de plantios em terra firme. Nos locais, foram coletados insetos de 74 espécies diferentes que visitaram as flores da palmeira.
Autora principal do artigo, a agrônoma da UFRA Leilane Bezerra conta que ao estudar o número de grãos de pólen de açaí transportados pelos insetos, a equipe descobriu que as abelhas nativas são o grupo de polinizadores mais eficaz.
Oito vezes mais pólen
“Descobrimos que mais de 70 espécies de insetos, incluindo abelhas, moscas, vespas, formigas e besouros, transportam pólen de açaí. Mas as abelhas nativas, incluindo espécies sem ferrão (Meliponinae) e solitárias (como as da família Halictidae), carregam pelo menos oito vezes mais pólen do que os outros insetos e representam seis em cada dez visitas de insetos às flores de açaí”, revela.
De acordo com a bióloga Márcia Maués, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental (PA), coautora do trabalho, até agora cientistas sabiam pouco sobre o percentual das contribuições dos diferentes grupos de insetos à polinização do açaí. Esse conhecimento, segundo ela, é fundamental para embasar recomendações aos agricultores sobre a polinização e manejo de polinizadores dessa palmeira tão importante para a economia do Pará e do Brasil.
“A polinização é um processo essencial para a produção de sementes e frutos em três quartos dos cultivos globais. Mas para muitos cultivos tropicais como o açaí, o conhecimento sobre polinização ainda era limitado, dificultando o desenvolvimento de práticas agrícolas amigáveis para os polinizadores’”, comenta a cientista.
Visitantes florais
A pesquisa analisou todos os visitantes da palmeira durante a fase feminina, cujo período é de quatro a oito dias, no período de maior floração da palmeira, entre março e junho. Isso, segundo Maués, serviu para facilitar a identificação dos potenciais polinizadores, “pois apenas os insetos que transferem pólen para as flores femininas podem polinizar”, detalha.
Ela explica que o açaí é uma espécie que depende de polinização cruzada entre flores masculinas e femininas em diferentes palmeiras. Ao buscarem alimento, os insetos carregam o pólen das flores masculinas para as femininas e é nesta última que acontece a polinização. “Todos são insetos visitantes, mas uns são coletores e outros, polinizadores. Nosso estudo focou no segundo grupo”, complementa.
O primeiro resultado encontrado pelos cientistas foi que mais da metade (51%) dos 596 insetos visitantes coletados na palmeira são abelhas nativas. As abelhas sem ferrão representam 38%; as moscas são 16%; outras abelhas (solitárias e em sua maioria nativas) somam 13%; vespas, 12%; formigas, 8%; e 6% são besouros.
A etapa seguinte foi quantificar os grãos de pólen presentes no corpo de cada inseto, o que a pesquisa chama de carga polínica. Essa atividade revelou a média de dois grãos por animal, pois em 25% deles não foi detectado pólen. “Porém, encontramos abelhas solitárias que carregavam até cinco mil grãos de pólen em seu corpo. Era como se tivesse mergulhada em farinha”, compara o biólogo Alistair Campbell, pesquisador visitante em atuação na Embrapa Amazônia Oriental.